OS MITOS SOBRE A HIDROPONIA

A técnica vem crescendo no país, mas parte dos consumidores ainda rejeita hidropônicos por preconceito

O cultivo hidropônico vem crescendo de forma significativa no Brasil desde a década de 80. A estimativa não oficial é de que a prática tem um incremento de aproximadamente 30% ao ano, especialmente nas regiões Sul, Sudeste e Norte. [ihc-hide-content ihc_mb_type=”show” ihc_mb_who=”5,6,7″ ihc_mb_template=”3″ ]Essa expansão é explicada pela preocupação dos consumidores em buscar uma alimentação mais saudável, com o aumento da demanda por hortaliças frescas. Mas o crescimento também ocorre devido às vantagens que ela traz aos produtores, como maior produtividade se comparado aos sistemas tradicionais, o que se deve a fatores como o aumento da proteção da cultura a fitopatógenos (quando aliado ao emprego do cultivo protegido), uso racional da água (podendo ser 80% mais econômico do que outros sistemas), possibilidade de plantio fora de época e diminuição no uso de insumos.

A Hidroponia, no entanto, ainda enfrenta rejeição por parte dos consumidores devido a mitos, como a contaminação por nitrato, uso excessivo de defensivos agrícolas, danos ao meio ambiente e falta de testes para comprovar supostos efeitos prejudiciais à saúde humana. Na realidade, um dos maiores benefícios da técnica é justamente a diminuição no uso de agrotóxicos. Os especialistas são unânimes em afirmar que cultivar hortaliças em Hidroponia não significa, necessariamente, produzir sem o uso de agrotóxicos. Afinal, mesmo no cultivo sem solo, ocorrem doenças e ataques de insetos. Naturalmente, esse tipo de ocorrência é esporádico, pois as plantas cultivadas em estufas agrícolas são mais protegidas das adversidades do clima, dos patógenos e dos insetos, além de serem melhores nutridas durante o ciclo de produção.

No entanto, uma estufa mal planejada, um manejo inadequado das cortinas ou ainda uma solução nutritiva com problemas pode favorecer o ataque de doenças, lembra o coordenador do Laboratório de Hidroponia (LabHidro) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Jorge Barcelos. E um ambiente quente, úmido e mal ventilado facilita o surgimento de moléstias, como podridão radicular e o míldio. E ainda há o agravante de que, na Hidroponia, uma vez estabelecida a doença, seu alastramento é rápido e fulminante, devido a maior proximidade entre as plantas e a facilidade de disseminação em todo o sistema por meio da solução nutritiva. O mesmo acontece quando se permite o ataque de insetos. “Uma vez que houve uma infestação, o produtor precisa adotar medidas rápidas de controle”, salienta Barcelos, que prefere usar chás e caldas ao invés de agrotóxicos para controlar as doenças nas suas estufas, onde cultiva folhosas como alface e rúcula e frutas como tomate e morango, além de árvores frutíferas.

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Contaminação por Nitrato – Outro preconceito bastante difundido – principalmente por sites ligados à produção orgânica – é que o produto hidropônico usa nitrato, substância da qual as plantas necessitam para sintetizar os nutrientes que usam para seu desenvolvimento, mas que, em altas concentrações, pode causar câncer e alterações na pigmentação da pele em seres humanos. Por ironia do destino, a Hidroponia se difunde mundialmente justamente no momento em que a agricultura orgânica é resgatada para ser uma espécie de “salvadora da pátria”. Barcelos admite que, de fato, a agricultura orgânica utilizada pelos nossos antepassados era uma excelente alternativa, pois não havia pressão sobre o meio ambiente, o cultivo era basicamente para consumo e troca de mercadoria. A prática permitia um excelente produto e de baixo custo ambiental.

Entretanto, o especialista alerta que a forma com que a agricultura orgânica está sendo utilizada hoje é um crime ambiental. “Tentando produzir toneladas de alimentos em cultivos intensivos e ainda abolindo totalmente os adubos químicos, joga-se toneladas de estercos geralmente não curtidos no solo”, afirma o coordenador do LabHidro. De qualquer forma, o grande acontecimento é que, com a agricultura orgânica, o consumo de agrotóxicos caiu vertiginosamente. Aliás, o especialista destaca que só não houve um retrocesso acentuado na ergonomia (saúde do trabalhador) porque houve uma redução na aplicação de defensivos agrícolas.

Barcelos salienta que em países desenvolvidos, como em muitos países europeus, a maior preocupação com poluentes oriundos do setor agropecuário diz respeito ao nitrato. E o principal responsável pela alta carga de nitratos, que acabam poluindo a água subterrânea, é justamente o esterco dos animais que, para agravar ainda mais a situação, é aplicado ao solo como adubação orgânica. “Além das águas das chuvas e das irrigações promoverem uma lixiviação desse nitrato para o subsolo, as hortaliças folhosas, dentre elas a alface, tendem a acumular nitrato em seu tecido”, ensina.

Quando o nitrato (NO3-) é absorvido em grande quantidade, a planta não dá conta de metabolizá-lo totalmente (para incorporá-lo a compostos orgânicos formando aminoácidos, proteínas e outros compostos nitrogenados). Ficando acumulado nos tecidos, quando ingerido com os alimentos, o nitrato no trato digestivo pode ser reduzido a nitrito (NO2-). Este, ao entrar na corrente sanguínea, oxida o ferro (Fe++ ==> Fe+++) da hemoglobina, produzindo a metahemoglobina. Esta forma de hemoglobina é incapaz de transportar o oxigênio (O2) para a respiração normal das células dos tecidos, causando a chamada metahemoglobinemia. “Outro problema é que parte do nitrito pode acabar combinando com as aminas, formando nitrosaminas, as quais são cancerígenas e mutagênicas”, ressalta.

As pesquisas têm mostrado que o maior índice de nitrato acumulado no tecido vegetal é justamente na agricultura orgânica, depois na agricultura convencional e, por último, na Hidroponia. A pesquisadora Lynette Morgan, da Nova Zelândia, tem avançado em pesquisas com nitrato. Embora sem publicação, o LabHidro realizou uma análise comparativa do nitrato presente na alface hidropônica e na orgânica. Como era esperado, o resultado do experimento mostrou que a alface orgânica tinha maior quantidade de nitrato. De acordo com outras pesquisas, em ambos os casos os teores de nitrato também estiveram abaixo dos limites máximos admissíveis na Europa (3.500 a 4.500 ppm, na matéria fresca). É comum encontrar valores entre 300 a 500 ppm.

Pesquisa desmente mito – O nitrato foi o tema de uma pesquisa realizada na Universidade Federal de Rondônia (Unir). Os pesquisadores analisaram a concentração de nitrato em cultivares de alface no sistema hidropônico em propriedades periurbanas de Porto Velho/RO. Eles selecionaram as variedades mais vendidas em feiras e supermercados – crespa, lisa e americana – de duas hidroponias fornecedoras do município. A coleta do material foi realizada simultaneamente nas duas propriedades, já que a temperatura e a luminosidade influenciam na concentração de nitrato. Após a identificação dos materiais em laboratório da Embrapa, os pesquisadores fizeram a pesagem da matéria fresca em três estágios de crescimento da planta: de oito a 15 dias, de 20 a 30 dias e de 40 a 50 dias, época ideal para o consumo. O nitrogênio total das plantas foi medido, verificando-se a inexistência de correlação entre o acúmulo de nutrientes e o crescimento da planta, contrariando conclusões da literatura especializada que associavam o acúmulo de nitrogênio (g de nitrogênio/planta) com o crescimento.

Os dados obtidos indicaram que o aumento de nitrogênio (sob forma de nitrato) na planta (alface) não implica em aumento na produção de matéria seca de alface nas condições de ambiente protegido em Porto Velho/RO durante o período estudado. Isso poderia indicar que o nitrogênio não proporciona aumento no crescimento/desenvolvimento, o que poderia levar ao acúmulo de nitrato. Entretanto, isso também não ocorreu conforme as medidas de nitrato, que representam a forma de nitrogênio acumulado.

O trabalho foi realizado nas condições da Amazônia Ocidental, que apresenta no período chuvoso uma redução na intensidade luminosa (inverno amazônico). A menor intensidade luminosa leva à redução na produção de matéria seca, devido a reduzida capacidade fotossintética da alface, com a consequente possibilidade de não aproveitamento da disponibilidade de nutrientes como o nitrogênio. Com isso, em tese, há a possibilidade de ocorrer o acúmulo de nitrato, como ocorre nas regiões frias.

Porém, esse fenômeno não foi observado, o que indica que os supostos efeitos cancerígenos da alface, quando consumida em regiões tropicais, são um mito. A concentração de nitrato foi verificada pelo Instituto Agronômico do Paraná (Iapar), onde foram encontrados níveis entre 433 e 547 miligramas por quilo de matéria fresca, bem abaixo do índice que indica toxicidade. Uma das conclusões apresentadas pelos pesquisadores em relação à baixa concentração de nitrato é a alta temperatura e luminosidade na região amazônica.

Falta de testes – Os detratores da Hidroponia também dizem que a tecnologia ainda não está muito testada nem difundida. Outro mito. No final da década de 90, a área destinada ao cultivo hidropônico no mundo era de aproximadamente 12 mil hectares. Nesta área de plantio, eram anualmente produzidas 3 milhões de toneladas apenas de hortaliças. Na época, destacavam-se como principais países produtores a Holanda, Espanha, França, Japão, Israel, Bélgica, Alemanha, Reino Unido, Canadá, África do Sul e Finlândia. Hoje, até mesmo pequenas ilhas do Caribe e países da América Latina e África utilizam a técnica na forma de hortas populares, reduzindo a taxa de desnutrição. Austrália e Canadá também estão investindo significativamente em Hidroponia.

As fazendas urbanas, que utilizam a automação para cultivar vegetais hidropônicos nos grandes centros urbanos, são cada vez mais comuns em países como Bélgica, Coréia do Sul, Estados Unidos, Holanda, Japão e Portugal. E nem mesmo o clima hostil do deserto do sul da Austrália é empecilho para os produtores hidropônicos. Uma instalação em escala comercial, com 20 hectares, foi montada para a produção de 17 mil toneladas de tomates por ano. O cultivo é feito com água do mar do Golfo Spencer. A água é bombeada para uma usina de dessalinização, que é alimentada por energia solar. Lá, o sal é removido para que a água possa ser utilizada na irrigação de 180 mil plantas de tomate dentro da estufa.

Nos Estados Unidos, estruturas montadas em antigos galpões e contêineres de transporte produzem alimentos hidropônicos nos grandes centros urbanos, o que permite à população acesso fácil a alimentos saudáveis e reduz os custos com transporte. E até mesmo o estado do Alaska, que tem um clima frio e muito severo e localidades completamente isoladas apostou na técnica do cultivo sem solo conduzida em contêineres para ter verduras frescas em qualquer época do ano. No Brasil, os cultivos hidropônicos comerciais foram difundidos na década de 80 pelos pioneiros Shigueru Ueda e Takanori Sekine, no estado de São Paulo, e vêm crescendo de forma rápida em todo o país em razão da grande quantidade e da qualidade diferenciada dos produtos hidropônicos. A região Sudeste concentra o maior número de produtores hidropônicos do país, especialmente o estado de São Paulo.

As estiagens e a carência de mão obra especializada para a agricultura são alguns dos fatores que têm estimulado a adoção do cultivo sem solo pelos agricultores paulistas. Mas a tecnologia alternativa de cultivo também tem sido adotada em muitos estados da região Nordeste, que sofre com a maior estiagem dos últimos 100 anos. Lá, a Hidroponia é utilizada para produção de verduras para consumo humano e forragem para alimentação animal. Na região Norte, devido ao forte calor e a elevada umidade do ar, a produção é feita em estufas climatizadas. Na região Sul, onde a maior dificuldade é a temperatura mais baixa, o cultivo sem solo vem ganhando cada vez mais espaço. Os agricultores produzem folhosas, brotos, microvegetais, flores comestíveis, morangos, pepinos, pimentões e forragens para alimentação animal.

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Prejuízos ao meio ambiente – Outro mito disseminado sobre a Hidroponia é que ela seria prejudicial ao meio ambiente, mas o cultivo hidropônico é mais amigo do ambiente do que as formas convencionais. Como a solução nutritiva circula em um circuito fechado, não existe o perigo de contaminação de solos ou cursos de água. O uso da Hidroponia na produção de hortaliças permite uma economia de 50% a 70% de água disponibilizada às plantas, uma vez que as taxas de evaporação, escoamento superficial e percolação são reduzidas.

O professor Glaucio da Cruz Genuncio diz que, fisiologicamente, uma planta, para formar um grama de massa seca, necessita de 500 gramas de água transpirada.

Assim, ao considerar uma planta de alface de 500 gramas de massa fresca e, que a concentração de água nesta planta aproxima-se de 90%, pode-se supor que, para que esta planta consiga gerar os 10% de massa seca (50g), ela necessitará em seu ciclo de vida (de aproximadamente 40 dias) 25.000 gramas de água, ou seja, 25 litros de água.

Ainda assim, pode-se considerar que a evaporação, a percolação e o escoamento superficial podem triplicar este consumo, chegando a 75 litros/planta/ciclo. “Com o uso da Hidroponia, estima-se que o consumo de água para o crescimento desta mesma planta aproxime-se ao consumo da água transpirada, isto é, 25 litros, representando um significativo dado quanto ao uso eficiente da água”, compara Genuncio.

Confira alguns relatos de consumidores hidropônicos:

Carmem Gamba, fotógrafa de Porto Alegre/RS – “Eu costumo comprar hortaliças hidropônicas, principalmente alface. Gosto muito porque o produto é mais limpo e não vem com terra nas folhas. Uso muito no preparo de saladas”.

Daiana de Souza jornalista

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Carmem Gamba, fotógrafa de Porto Alegre/RS – “Eu costumo comprar hortaliças hidropônicas, principalmente alface. Gosto muito porque o produto é mais limpo e não vem com terra nas folhas. Uso muito no preparo de saladas”.

Daiana de Souza, jornalista de Campo Bom/RS – “Eu compro hortaliças de um tio que cultiva da forma convencional, no chão. Mas também compro produtos hidropônicos. Gosto muito da textura e da crocância das hortaliças hidropônicas. E a gente não encontra hidropônicos com folhas machucadas”.

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Thaís d’Ávila, jornalista de Porto Alegre/RS – “Eu compro rúcula hidropônica. Ela dura bem mais na geladeira e é muito mais fácil de lavar, pois ela já vem limpinha”.

Ivan Vieira, jornalista de Florianópolis/SC – “Na feira que ocorre nas segundas, quartas e sextas no centro, tem muita coisa. Sempre compro temperos e saladas verdes. Mas esses vêm de Antônio Carlos/SC, cidade no começo da serra que vive da agricultura. Os hidropônicos parecem bonitos e saudáveis. E tento sempre replantar as raízes que sobram. Tenho alguma cebolinha verde na horta que foram de origem hidropônica”.

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Por Gustavo Paes

Revisão e publicação: Gabriel Costa

Crédito de fotos ilustrativas e de perfil dos quatro consumidores: Divulgação / Acervo pessoal.

Crédito da foto de Jorge Barcelos: Jair Filipe Quin

Crédito da foto de Glaucio Genuncio: EDUVALE

Fonte: Jorge Barcelos e Glaucio Genuncio

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