“… quando cheguei ao Sertão de Pernambuco, há 10 anos atrás, para assumir o cargo de professora da UFRPE/UAST, fui convencida de que isso não era para nós, que hidroponia no sertão era um sonho inatingível.”
Rosa Honorato Almeida
Rosa Honorato Almeida, 52 anos, natural da cidade de Areia- PB, é doutora em Agronomia/Agricultura e professora no Curso de Engenharia Agronômica da Universidade Federal de Pernambuco.
Nesta entrevista ela conta sobre sua trajetória como professora e uma estudiosa da hidroponia e como chegou ao seu sonho de promover a cultura hidropônica e de como está iniciando a sua própria produção sem solo em pleno sertão brasileiro.
PH – Qual a formação de Rosa Honorato Almeida ?
RH – Sou formada em Engenharia Agronômica pela Universidade Federal da Paraíba, Campus III- Ciências Agrárias Areia-PB e Mestrado em Manejo de Solo e Água pela mesma universidade. Doutorado Agronomia/Agricultura pela Universidade Estadual Júlia Mesquita – Faculdade de Ciência Agronômicas (Unesp/FCA)- Botucatu-SP.
Desde 2009 sou professora no Curso de Engenharia Agronômica da Universidade Federal de Pernambuco, Unidade Acadêmica de Serra Talhada-PE, onde ministro as disciplinas Olericultura, Controle de Plantas Invasoras e Grandes Culturas Agrícolas (Algodão e Soja), desenvolvendo trabalhos de pesquisa principalmente na área de Olericultura.
PH – Como conheceu o sistema de cultivo sem solo?
TH – Por ocasião do desenvolvimento de minha tese de doutorado, na UNESP/FCA. Porém, o foco era a hidroponia no sistema de floating utilizando vasos, e a partir de então, fui me interessando mais e mais pelo tema.
E após o doutorado, tive a oportunidade de atuar como Bolsista de Desenvolvimento Regional pelo CNPq na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Campus de Vitória da Conquista-BA. Lá desenvolvi alguns trabalhos nessa área, mas ainda de forma muito tímida.
Apesar disso, essa época foi uma oportunidade decisiva para expandir meus conhecimentos nessa área, pois pude ministrar aulas e palestras sobre o tema para alunos do curso de graduação e Pós – Graduação em Agronomia, isso fez com que eu me aprofundasse no tema, sendo essencial na consolidação dos conhecimentos.
PH – O que mais chama sua atenção neste processo de produção?
RH – O que me chama mais atenção no processo é primeiramente a sua capacidade de produção em condições adversas. Isso por si só já é uma grande vantagem, porque amplia o horizonte de produção.
O outro fator é o fato do produtor conseguir planejar com maior precisão a produção, pois os riscos de perda são bem menores e garante para o consumidor uma maior regularidade no fornecimento dos produtos.
PH – Qual sua análise para a Hidroponia no momento atual de mercado?
RH – O mercado é crescente, existindo ainda uma demanda não atendida, pois cada vez mais pessoas procuram por produtos hidropônicos. Essa procura se dá possivelmente porque o sistema é uma produção mais limpa, com reduzido uso de agroquímicos.
Além do mais, a produção hidropônica possibilita o pronto atendimento das exigências das plantas, o que resulta em produtos nutricionalmente mais ricos em relação aos convencionais.
E ainda, por meio desse sistema, o cultivo pode ser constante ao longo de todo o ano e, no momento em que se discute uso racional de água na agricultura, a economia desse recurso proposto pela hidroponia faz com que esse sistema seja um grande negócio para pequenos produtores agrícolas.
PH – E quanto a produção Hidropônica em sua região/estado?
RH – A hidroponia na região ainda é bastante incipiente; pouco desenvolvida, primeiramente em função da falta de conhecimento acerca deste método de cultivo.
Mas também pela crença de que as condições ambientais reinantes na região não sejam adequadas para produção hidropônica. Isso cria uma demanda de estudos que visam a adaptação do sistema para as nossas condições regionais.
PH – Quais os desafios para a produção hidropônica na sua região?
RH – O clima na minha região é semiárido, com baixa precipitação pluvial, alta intensidade luminosa, temperatura média em torno de 30 graus.
Em se tratando da produção hidropônica considero que existem vários desafios a serem superados. O principal está na qualidade da água, cujos teores de sal são altos e por que junto com alta temperatura limita o desenvolvimento das plantas. Isso altera a dinâmica de absorção da solução nutritiva.
PH – Existe algum projeto específico voltado para a Hidroponia?
RH – Há algum tempo venho trabalhando junto aos meus alunos do Curso de Agronomia da UFRPE/UAST, tentando “plantar” neles a sementinha da hidroponia. Atualmente estou com dois projetos em vias de implantação cujo objetivo é mostrar que é possível driblar os fatores ambientais e a falta de conhecimento acerca do assunto e tornar a produção hidropônica na região uma realidade.
No ano de 2019 durante um evento acadêmico, ministrei uma oficina intitulada “Viabilidade da produção de hortaliças em hidroponia no pleno Sertão de Pernambuco”. E 30 dias antes no seu início, para enriquecer o curso, eu, juntamente com os alunos monitores da Oficina, construímos um pequeno sistema hidropônico na universidade.
Fizemos uma estrutura bem simples e básica com o que tínhamos em mãos naquele momento, pois o objetivo era fazê-los conhecer um sistema em funcionamento com todo o seu encanto e suas dificuldades práticas.
Começamos do zero montando a estrutura física e depois tivemos a oportunidade de acompanhar o desenvolvimento diário das plantas, assim como a dinâmica do sistema durante todo o ciclo, observando na prática todas as dificuldades que surgiam no dia a dia.
Observamos que os inscritos na oficina, cerca de 30, não eram alunos apenas do curso de Agronomia, mas também de Química, Zootecnia e Engenharia de Pesca, isso nos levou a sentir a grande demanda por conhecimentos acerca do tema.
O curso foi um sucesso e depois dele surgiram algumas possibilidades de orientação de trabalhos de pesquisa e conclusão de curso na área de hidroponia, o que me deixou imensamente feliz porque a sementinha afinal estava frutificando.
No campo pessoal, no ano corrente, decidi colocar em prática o sonho de iniciar o cultivo de hortaliças em hidroponia numa pequena propriedade que a família adquiriu recentemente. Inicialmente terá como meta realizar estudos de hidroponia, porém, quero futuramente torná-la uma área de produção comercial.
PH – Quais suas considerações quanto ao trabalho empreendido pela Plataforma Hidroponia e a importância dos conteúdos publicados?
RH – A Plataforma Hidroponia foi outro divisor de águas na minha vida acadêmica, pois por meio dela, tenho aprendido a cada dia um pouco mais sobre o tema. Ela nos presenteia com conteúdos maravilhosos sobre a hidroponia praticada não somente em terras distantes ou por especialistas, mas também da hidroponia praticada por pessoas que decidiram trocar a cidade pelo campo, ou simplesmente por aqueles que viram nela a oportunidade de produzir de forma diferenciada. Enfim, a plataforma traz notícias de uma hidroponia mais “palpável”, mais real, desenvolvida por pessoas comuns, experimentadoras, assim como nós aqui no sertão, e essas experiências são bastante enriquecedoras.
PH – Como pesquisadora e docente, como será seu posicionamento de orientação relacionado com o cultivo sem solo para os acadêmicos sob sua mentoria?
RH – Venho estudando a hidroponia há vários anos e, por muito tempo estive convencida de que nossa região não reunia as características adequadas para o cultivo sem solo. Pois, quando cheguei ao Sertão Pernambuco, há 10 anos para assumir o cargo de professora da UFRPE/UAST, fui convencida de que isso não era para nós, que hidroponia no sertão era um sonho inatingível.
Era desacreditada por colegas de profissão e produtores. O tema era visto com desconfiança também pelos meus próprios alunos, que enxergavam em mim uma professora sonhando com o impossível.
Ao longo dos anos continuei a estudar a hidroponia e sempre que havia oportunidade, fosse por meio de aulas, fosse por meio de palestras, minicurso, oficinas estava sempre trazendo o tema à tona. A hidroponia, para estes, parecia uma coisa muito distante da realidade. Por outro lado, o acesso às informações era difícil. Além do mais, trazia uma linguagem muito técnica, que dificultava a compreensão para os que não eram da área científica. Mas eu não me permitia desistir.
Dentro dessa perspectiva de seguir acreditando no cultivo sem solo no sertão, há uns três anos atrás, em uma visita técnica, tive oportunidade de conhecer um produtor hidropônico de alface, no Sertão da Paraíba, distante aproximadamente 50 km da cidade onde está instalada a UFRPE/UAST.
Seu “Cícero Manduca” – produtor que me trouxe uma mudança na visão sobre o que era possível em termos de produção hidropônica. Ele era um produtor familiar, que dada a visão empreendedora, viu na hidroponia uma possibilidade de diversificar a produção de hortaliças e melhorar o atendimento aos seus clientes. Na nossa região, nos meses mais quentes do ano, é comum ocorrer redução no fornecimento de hortaliças em função das condições climáticas desfavoráveis.
Segundo ele, quanto mais conhecia a hidroponia, mais queria saber. Com isso, construiu uma estrutura bastante simples, muito distante do considerado até então ideal para o cultivo hidropônico, porém muito eficiente e que trazia resultados surpreendentes.
Ouvi-lo falar da sua experiência era inebriante, de como superava dia a dia as dificuldades, do sucesso obtido com esse empreendimento e da sua vontade de expandir a produção nesse sistema.
Eu finalmente tinha encontrado o que procurava há tanto tempo, a prova de que a produção hidropônica no Sertão não era utopia e os dados não deixavam dúvidas. Ou seja, esse produtor, com sua estrutura simples e considerada inadequada para os padrões até então conhecidos, conseguia produzir cerca de 3.000 pés de alface por semana na maior parte do ano, atendendo cerca de cinco cidades dentro e fora do município.
Andrea Weschenfelder
EDITORA WEB PLATAFORMA HIDROPONIA
Jornalista e Editora de Publicações